sexta-feira, 22 de março de 2013

Um post sobre políticas de leitura


 Esta fala foi apresentada no I Colóquio de Literatura, Cultura e Contemporaneidade da PUC-Rio. E é o resumo de um artigo de mesmo título.

TEMOS VAGA PARA LITERATURA:
Quando a Literatura entra na pauta das políticas públicas,
o que fazer?
Carmélia Aragão1
Recentemente, ao concluir a leitura do livro da professora iraniana Azar Nafisi, Lendo Lolita em Teerã: memória de uma resistência literária2, publicado em 2003, nos Estados Unidos, e traduzido no ano seguinte aqui no Brasil, resolvi mudar o tom inicial deste trabalho e complementar o subtítulo com uma pergunta: o que fazer?
Profª. Nafisi conta em seu livro o quanto lhe foi vital a existência da literatura durante os 18 anos passados na República Islâmica do Irã, implantada, em 1979. Proibida de ministrar aulas nas universidades de Teerã, Nafisi criou um grupo de estudos secreto em sua casa formado por sete alunas para poderem ler e estudar literatura de língua inglesa. Como disse, parafraseando Nabokov: a criatividade é a insubordinação em sua forma mais pura.
Outro exemplo de resistência por meio da literatura veio-me dois anos antes quando assisti à entrevista da ex-senadora da Colômbia, Ingrid Betancourt, no período em que esteve no Brasil para divulgação de seu livro: Não há silêncio que não termine em 2010. Em o seu relato sobre a angústia vivida durante os seis anos como refém das FARC, me chamou atenção ouvi-la dizer que, na selva, tentava ocupar a cabeça com os poemas que havia memorizado como os do poeta Neruda, que foi amigo de seu pai, tanto que o título do livro é um verso do poeta chileno3.
Acredito que existam muitas pessoas que vivam ou viveram em regime de exceção e que se refugiaram em obras na literatura. Talvez por isso, tenha ouvido várias vezes de alguns adultos e jovens, de forma impensada, talvez, que a efervescência artística cultural de nosso país foi durante a época da ditadura militar que teve início com o golpe de 64. Embora essa afirmativa seja simplista e impensada, devido às condições que nos levou a produzir arte/cultura nessa época, ela me faz pensar, juntamente com os outros casos aqui citados, em Deleuze, no prefácio de Crítica e clínica (1997) 4:
O mundo é um conjunto de sintomas cuja doença se confunde com o homem. A literatura aparece, então, como um empreendimento de saúde. [...] Qual saúde bastaria para libertar a vida em toda parte onde esteja aprisionada pelo homem e no homem, pelos organismos e gêneros e no interior deles? A frágil saúde de Spinoza, enquanto dura, dá até o fim testemunho de uma nova visão à passagem da qual ela se abre.
[DELEUZE: 1997,13-14]
Em julho de 2008, após minha defesa de mestrado em literatura, fui convidada por um amigo escritor e também mestre em Letras pela mesma Universidade (UFC), para trabalhar na Secretaria de Cultura do Estado do Ceará. Queriam “ressuscitar” um projeto do ex-coordenador de políticas do livro e de acervos, Fabiano dos Santos Piúba5 que, naquele momento, estava no MinC como diretor de Livro, Leitura e Literatura/ atual DLLLB (acréscimo das bibliotecas). Era o Projeto Agentes de Leitura do Ceará6.
Em 2005, o Estado do Ceará havia criado o Fundo Estadual de Combate à Pobreza/FECOP com o objetivo de implantar projetos em diversas áreas como tecnologia, educação e cultura nas regiões onde o IDH-M era baixo. Foi então que surgiu o Projeto Agentes de Leitura do Ceará com idealização e execução do coordenador já citado, Fabiano dos Santos, e também do professor Eduardo Loureiro. O projeto tinha a operacionalização inicial baseada nos agentes de saúde. Para atuar como agente de leitura, o projeto tinha em vista os jovens maiores de 18 anos que haviam concluído Ensino Médio7 e com família portadora de NIS8. Os selecionados passavam por um processo de formação, recebiam uma bolsa para complementação de renda, e mais um acervo de 100 livros de literatura, uma mochila e uma bicicleta para visitar as 25 famílias por eles cadastradas nas comunidades onde atuariam, acompanhando o processo leitor de cada uma dessas famílias: lendo livros, emprestando-os, enfim, “formando leitores”.
Como ocupei o cargo de assessoria administrativa no período de 2008 ao início de 2010 9 tive bastante contato com os gestores locais e com esses jovens agentes. Um dia, enquanto atravessava atarefadamente o saguão do auditório onde estava sendo realizado III Encontro Estadual dos agentes de leitura do Ceará um deles me parou e perguntou: e nós, o que fazemos aqui? Essa questão foi fundamental para que eu pudesse perceber nosso posicionamento equivocado como gestores públicos que, nesse caso específico, ainda era mais grave, pois tínhamos formação em Letras, frente a esses “meninos”. Sim, havia algo de muito podre na maneira como estávamos lidando com a Literatura, que afirmávamos possuir poderes mágicos.
O fato é que a questão posta por esse agente ecoou bastante na minha cabeça durante o evento. E depois e ainda. E, dada a importância de estar aqui com vocês, hoje. Dia 1ª de dezembro deste mês, pedi para ele que me escrevesse sobre nosso encontro de dois anos atrás para que vocês entendam o que acontecia:
Havia algo de muito “engraçado” nas formações (encontros) do projeto Agentes de Leitura do Ceará. Lembro, com saudosa nostalgia, da estrutura montada em Fortaleza por ocasião de nossos encontros (formação, bienal...)! Os hotéis suntuosos à beira-mar, os almoços e jantares... em restaurantes luxuosos (aquilo sempre me trazia na lembrança a estória da Alice no país das maravilhas...)! Aquilo não era nosso mundo, de tão bom, beirava ao “estranho”. Aquela supra-realidade nos causava euforia e igualmente um vazio. Faltava alguma coisa mais. Afinal, que sentido tinha aquilo?
Foi quando entendi que [...] Nosso papel ativo se restringia lá, nas famílias visitadas, que quando tentávamos colocar em prática as “diretrizes” construídas por nossos “superiores” e repassadas a nós nos encontros na capital. Não tínhamos voz. Apesar de supor que tínhamos muito a dizer, não havia oportunidade e/ou espaço, o microfone era privilégio dos pseudo sabedores/definidores das práticas didático-pedagógicas que deveríamos executar!
Recebíamos tudo pronto em “envelopes” lacrados e frases afirmativas! Ora, afinal, estávamos em processo de treinamento, o que poderíamos dizer, no que poderíamos contribuir? Assim, muito ficou sufocado dentro de nós, tínhamos muito a falar e a propor. Nada dissemos10.


No Brasil, a leitura foi transformada em política de estado pela lei n° 10.753, de 30 de outubro de 2003 que instituiu a Política Nacional do Livro, instrumento legal que autoriza o Poder Executivo a criar projetos de incentivo a leitura e acesso ao livro. A regulamentação dessa lei apresentou o Plano Nacional do Livro e da Leitura- PNLL e, com ele, as formas possíveis de executar as ações dessa política. Com isso a questão da leitura deixa de pertencer apenas à Educação e passa a ser um projeto de nação, podendo vincular-se às demais instâncias, como a Cultura.
Dentro dos princípios norteadores do PNLL que, por sua vez, são baseados em princípios identificados pela UNESCO como necessários para a existência expressiva de leitores em um país, o texto literário aparece como a principal escolha para ser adotado nos trabalhos com a leitura. No PNLL os motivos dessa escolha estão embasados por Antônio Cândido:
a) A capacidade que a literatura tem de atender à nossa imensa necessidade de ficção e fantasia. b) Sua natureza essencialmente formativa, que afeta o consciente e o inconsciente dos leitores de maneira bastante complexa e dialética, como apropria vida em oposição ao caráter pedagógico e doutrinador de outros textos; c) seu potencial de oferecer ao leitor um conhecimento profundo do mundo, tal como faz, por outro caminho a ciência.
[PNLL: 2007, 32]
Para chegarmos a esse ponto, trinta e três anos antes, em 1979, com a intenção de criar uma “economia ética”, o indiano Amarthya Sen fez uma revisão dos critérios de avaliação de qualidade de vida, o IDH, no campo da economia de desenvolvimento e da política internacional que na época classificava os países em função do PIB. Para Sen esse sistema de avaliação não priorizava elementos essenciais para a vida humana, como a expectativa de vida, a mortalidade infantil, o acesso à educação, a geração de emprego e a liberdade de expressão. O economista escolheu o termo “desenvolvimento de capacidades” para falar de uma série de opções oferecidas a uma pessoa para que esta possa escolher a forma de vida que lhe é mais significativa. Assim, o desenvolvimento das capacidades partiria dos sujeitos humanos, diferenciando-se das concepções econômicas estandardizadas, que não respeitavam as subjetividades.
Para a elaboração dos fundamentos filosóficos do desenvolvimento das capacidades, Sen contou com a parceria da filósofa norte-americana Martha Nussbaum. Nussbaum, a partir de Aristóteles, resgata a noção grega de excelência humana (Arete), que seria a necessidade de desenvolvimento pleno do homem e da vida entendida como atividade (práxis). Assim, tal como Aristóteles, a filósofa enumera as “capacidades humanas básicas para que a vida do homem atinja sua excelência. São elas: vida; saúde; integridade física; sentidos, imaginação e pensamento; emoções; razão prática; afiliação; outras espécies; jogo; e controle sobre o próprio entorno.
É interessante perceber que, mesmo se tratando de um discurso sobre economia que nos parece uma ciência fechada, pode-se encontrar em meio à reavaliação do IDH feita por Sen, o direito à imaginação e ao pensamento como um princípio básico para nosso desenvolvimento como seres humanos plenos. Isso me faz pensar automaticamente em Literatura. E esta, possuidora da natureza das Artes, portanto sem fins obrigatórios, pode servir a todas as ciências, a todas as pessoas.
No que diz respeito à filosofia política, Nussbaum aposta inteiramente na expansão das “humanidades” como caminho para o desenvolvimento da democracia no sentido de assegurar nosso direito à cidadania. No livro Sin Fines de Lucro: Por qué la democracia necessita de las humanidades (2010) diz que:

La idea de la rentabilidad convence a numerosos dirigentes de que la ciencia y la tecnología son fundamentales para la salud de sus naciones no futuro. Não sou contra que los países deban dejar de mejorar esos campos, me preocupa que otras capacidades igualmente fundamentales (…)
Estas capacidades se vinculan con las artes y con las humanidades. Nos referimos a la capacidad de desarrollar un pensamiento crítico; la capacidad de transcender las lealtades nacionales como “ciudadanos del mundo”; y por último la capacidad de imaginar con compasión las dificultades del próximo.
[NUSSBAUM: 2010, 25-26]

Por esse motivo, Nussbaum atribui à Literatura, um papel de destaque. No ensaio “La imaginación literaria en la vida publica” (1995), a filósofa desenvolve o “poesia pública” de Walt Whitman, que seria aquela capaz de nos mostrar os conflitos entre os deveres do indivíduo para consigo e seus deveres para com os outros.Cito:
La literatura se centra en lo posible, invitando a sus lectores a preguntase acerca de sí mismos. Aristóteles está en correcto. Al contrario que en la mayoría de las obras históricas, las obras literarias invitan el lector a ponerse en el lugar de gentes de muy diversos tipos y a asumir sus experiencias. En los mismos modos en cómo se dirigen a sus lectores imaginarios, transmiten la sensación de que existen eslabones de posibilidades, de pelo al menos a un nivel muy general entre los personajes y el lector. Las emociones y la imaginación del lector, en consecuencia, permanecen muy activos, y es la naturaleza de esta actividades y su relevancia para el pensamiento publico lo que me interesa. (NUSBAUM: 1995,44-25)
Na defesa da Literatura Nussbaum dá exemplos a partir do romance Tempos Difíceis, de Dickens e observa ainda que a personagem central do romance, o avarento senhor Grangrid também tinha consciência que do ponto de vista político econômico a imaginação literária seria algo perigoso, pois levaria juízes, legisladores e gestores de bens públicos a procurar saber sobre a qualidade de vida das pessoas, ou seja, a Literatura estimula a ação. A leitura é um ato político.
Percorrendo o raciocínio exposto até aqui, vejo-me diante de um caminho repleto de bifurcações. A primeira delas é que não vivemos em regime de exceção como nos dois exemplos citados no início deste trabalho, não nos encontramos na situação da professora Nafisi e suas alunas sob a censura do regime islâmico. Muito menos exilados do mundo numa selva como a ex-senadora Ingrid Betancout. Supomos que vivemos em um país democrático que respeita, pelo menos teoricamente, as diretrizes aqui expostas e que se esforça para melhorar cada vez mais o seu IDH e, para isso, além das outras medidas necessárias, desenvolve projetos como o Agentes de Leitura, fruto de uma política de estado de apoio à leitura com base em textos literários. No entanto, parece controverso o lamento de invisibilidade do agente Gilmar Oliveira, já que pretendemos seguir uma ideia de justiça baseada no reconhecimento do outro, conforme propõe a teoria das capacidades de Sen e Nussbaum. Haveria um embate entre as mentes que pensam e as que executam esses projetos como neste exemplo experienciado por mim?
Sim, temos vaga para a Literatura, ou melhor, quando a Literatura entra na pauta das políticas públicas: o que fazer?


BIBLIOGRAFIA UTILIZADA:
CASTILHO MARQUES NETO, José (org). PNLL- Plano Nacional do livro e leitura: textos e história (2006-2010). São Paulo: Cultura Acadêmica Editora, 2010.
DELEUZE, Gilles, Crítica e Clínica. Trad. Peter Pál Pelbart. São Paulo: Ed. 34, 1999.
NAFISI, Azar, Lendo Lolita em Teerã: memória de uma resistência literária. Trad. Fernando Esteves, Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.
NUSBAUM, Martha, “La imaginación literaria en la vida pública” In ISEGORÍA: Revista de Filosofía Moral y Política nº 11, 1995, p.42-80.
________. Las fronteras de la justícia: consideraciones sobre la exclusión.Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica, 2007.
________. Sin fines de lucro – Por qué la democracia necesita de las humanidades. Buenos Aires: Katz Editores, 2010.


1 Carmélia Aragão é aluna do curso de doutorado da PUC - Rio pelo programa de pós- graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade. É também bolsista da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico/FUNCAP.  Esta fala foi apresentada no I Colóquio de Literatura, Cultura e Contemporaneidade da PUC-Rio. E é o resumo de um artigo de mesmo de mesmo nome.


2 NAFISI, Azar, Lendo Lolita em Teerã: memória de uma resistência literária. Trad. Fernando Esteves, Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.


3 "Si no se saben mis palabras/ no dudes que soy el que fui./ No hay silencio que no termine./Cuando llegue el momento, espérame,/ y que sepan todos que llego/a la calle con mi violín"


4 DELEUZE, Gilles, Crítica e Clínica. Trad. Peter Pál Pelbart. São Paulo: Ed. 34, 1999.


5 Atualmente, Fabiano dos Santos Piúba está como diretor de Leitura, Escrita e Bibliotecas do CERLALC-UNESCO.


6 O modelo do Projeto Agentes de Leitura do Ceará foi adotado desde 2009 pelo MinC com o Programa Mais Cultura e ampliado para outros estados do Brasil do Norte, Nordeste, Sudeste e Sul sob a orientação pedagógica da Cátedra UNESCO de Leitura PUC-Rio com direção da profª Eliana Yunes. Atualmente, a Colômbia estuda a possibilidade de implantação o mesmo modelo em seu território.


7 Uma das razões da migração da população nordestina jovem para os grandes centros urbanos de seus estados ou para o sul e o sudeste do país, o antigo êxodo rural, foi/ é a falta de perspectiva de trabalho desses jovens em seus municípios. (N.A)


8 Número do Indicador Social que a família recebe ao se cadastrar nos programas de assistência às famílias de baixa renda do Governo Federal. Benefício foi criado durante o governo do presidente Lula em 2003. Exemplo: Bolsa Família.


9 A assessoria administrativa do projeto consistia em dar entrada e acompanhar mensalmente o processo de pagamento das bolsas dos agentes, (o que me fez memorizar quase todos os nomes de agentes por município); redigir e acompanhar os termos de referência para licitações (junto com as coordenações responsáveis: administração e jurídica); desenvolver logística de distribuição de acervo, bicicletas, entre outras coisas.


10 Excerto do depoimento de Gilmar Rodrigues de Oliveira, Agente de Leitura de 2008 a 2010, hoje, professor de História da rede municipal de ensino, em Alcântaras-CE. Depoimento colhido via email em 01/12/12. Grifo meu.




domingo, 17 de março de 2013

Os gatos do Sr. Abud


O Sr. Felipe Abud é fotógrafo. Na verdade, acho que ele é poeta. Um poeta sem palavras. Talvez o mais difícil de todos. Captar a poesia onde a palavra não dá conta exige muita sensibilidade, quase mágica. Há quem diga que o poeta tem 90%  de transpiração(técnica) e 10% de inspiração(intuição) . Acredito que o Sr. Abud consiga balancear esses números em seus trabalhos (fotos). Há algum tempo, uns dois anos, ele me envia fotos de gatos. Felinos sem compromisso, vadiando pelas ruas e pelas universidades. Felinos robustos, de estimação. Vou compartilhar aqui alguns desses presentes.

OBS: Colocarei as referências de acordo com  as informações e as datas dos emails que recebi .

Gato de estimação, Fortaleza, out 2011. Foto: F.Abud

Gato de estimação, Fortaleza, out 2011. Foto: F.Abud

Gatos universitários, UFC,2011. Foto: F.Abud


Gato passeando por aí, França 2011. Foto: F.Abud

Gato na rua, França 2011. Foto: F.Abud
Gato na rua, França 2011. Foto: F.Abud

Gatinho na rua, França 2011. Foto: F.Abud

Gato expositor de chapéus-  2010. Foto: F.Abud

Gato de estimação- Fortaleza, set/2012. Foto: F.Abud
Gato à espreita-2010. Foto: F.Abud
Gato de uma loja de reparos de eletrodomésticos
Fortaleza, nov 2011. Foto: F.Abud

Gato e cão de uma loja de reparos de eletrodomésticos
Fortaleza, nov 2011. Foto: F.Abud
Gata observando Rodin,
(Sra  Janaïna Abud no Museu Rodin, França 2010, acho)
Foto: F.Abud

sexta-feira, 15 de março de 2013

E o Nordeste ficar independente

Vera e eu,em 15.03.2013

Nunca lembramos tanto de casa quando estamos fora de casa. Aqui no Rio não posso reclamar da falta de reminiscências. A todo momento escuto minha prosódia, participo de lembranças de gente que nunca vi, mas é como se eu estivesse lá. Reriutaba, Groaíras, São Benedito, Guaraciaba, Tianguá. Mesmo quando não falam do Ceará,  falam do nordeste.  Alagoas, Pernambuco, Piauí. E é como se também eu fosse de lá.

Essa é Vera. Nos conhecemos por acaso.  Somos nordestinas e não desistimos nunca. Quando a saudade aperta, ela se sente cearense e eu me sinto baiana. A saudade é um estado em comum.

Agora que estou aprendendo a visitar a mais a cozinha, senti minha primeira felicidade. tive a aprovação da Vera nos meus quitutes.
Experimentei pela primeira vez o sabor da partilha. Inigualável!

Crônica: COPA, SECA e IDH.



Sertão-foto: Felipe Abud


COPA, SECA e IDH.

Raimundo Aragão
rn_aragao@hotmail.com
    
 O Brasil se mobiliza para realizar a Copa do Mundo de 2014. Trata-se de evento internacional e nossa imagem está em jogo. A seleção poderá até fracassar  em campo, mas o Brasil na organização da Copa, jamais.  Estádios (arenas, agora) monumentais, viadutos, são construídos.  Metrôs e outros grandes projetos na área de mobilidade urbana são rapidamente implementados em 12 importantes capitais. Há um esforço coordenado  do poder público nas esferas municipal, estadual e federal, inclusive,  com recursos do exterior para realizar essas obras, tidas e aceitas por mim, pela torcida do Guarany de Sobral e pelo papa Francisco que gosta de futebol, como prioritárias. Além disso, estas permanecerão após a festa e os moradores das  metrópoles hoje sufocados pelo trânsito serão beneficiados.
   Por que isso não ocorre com relação à seca? Alguém tem dúvidas de que o abastecimento de água e comida é prioridade máxima?
   Há registros de uma grande estiagem no Ceará entre 1580 e 1583, quando o colonizador nem havia chegado. Daquele ano até 2013,  a seca virou literatura nas penas de Rodolfo Teófilo, Domingos Olímpio, Graciliano Ramos. Foi tema de debates calorosos no Congresso, desde os tempos do Império. Virou piada nas palavras do Imperador Pedro II que prometeu “ vender até a última joia da Coroa para salvar os flagelados” e na ação de governo que colocou na década de 1970,  alguns babacas num  velho DC3 carregado de sal que era jogado nas nuvens para produzir chuva. Que nuvens?
    A seca não é, portanto,  um fenômeno isolado. Ao contrário, faz parte da nossa rotina, tal qual terremotos no Japão. Lá, todas as estruturas de edificações foram adaptadas. A população é treinada para enfrentar o problema, o que evita  mortes e destruição. Israel e Estados Unidos (em algumas regiões) enfrentaram com seriedade as secas e obtiveram bons resultados. É claro que a realidade daqueles países é outra,  em se tratando de latitude, clima e solo, mas as modernas tecnologias estão aí para serem utilizadas. Por sinal, a presidenta Dilma acaba de anunciar o aporte de 32,5 bilhões de reais para inovação em tecnologia. Será para elevar a produtividade da soja no interior de São Paulo onde os agricultores enfrentam sério problema: faltam carretas para transportar o produto, em virtude da grandiosidade da safra.
 . Milhões de recursos foram gastos através da Sudene, DNOCS, Banco do Nordeste e milhões de brasileiros morreram de fome, sede e doenças relacionadas à miséria. Em pleno ano de 2013, segundo ano de seca terrível,  pouca coisa mudou nessa triste história. As pessoas continuam sofrendo com a falta de água potável e vendo, impotentes, seus animais morrerem aos montes. Nas cidades já se nota  a escassez de vários produtos agrícolas e os preços dispararem, penalizando sempre os mais pobres.
   A providência mais visível no Nordeste é a decretação, de “estado de emergência”, após cada seca instalada.. A palavra “emergência” lembra-nos sempre o espaço  dantesco dos hospitais de onde ninguém sai curado, (às vezes sobrevive). A cura vem através de procedimentos em salas de cirurgia, laboratórios, clínicas de reabilitação. No caso das secas, passado o sufoco com a chegada das chuvas, finge-se que o grande mal não retornará e nenhuma providência radical, eficaz,  é tomada. O presidente Juscelino conseguiu, em 1958,  feijão e arroz (ruins) do exterior e muito jabá do Sul e ninguém passou fome. Em 2013, o  milho deixou de vir  do Centro-Oeste, onde está sobrando com a supersafra, a tempo de salvar parte dos rebanhos, por que um burocrata do Ministério “esqueceu” de assinar  a autorização.
O governo brasileiro investe bilhões no combate à desigualdade social, no que vem conseguindo bons resultados. A incoerência, o erro histórico é deixar a região Nordeste refém do clima, puxando para baixo, os números que refletem os resultados desse investimento.. No país com a maior reserva de água doce do mundo, cidadãos sofrem sem água. No maior produtor de soja e milho, parte dos rebanhos morre de fome. O resultado é que, apesar das conquistas, na aferição do  IDH – Índice de Desenvolvimento Humano de 2013, o Brasil ficou atrás dos nanicos Uruguai e Chile, da falida Argentina e, pasmem: perdeu feio para Venezuela e Cuba, pátrias dos “demônios” Chávez e Fidel.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Um pequeno passo para o Vaticano, um grande passo para a América Latina (?)



Nossa hermaníssima santidade: Papa Francisco I


Já estava me acostumando com o papa Bento XVI de aviso prévio. Aliás, que figurinha pouco carismática!. Na época da eleição dele, escrevi pra revista Carta Capital, movida um espírito revolucionário eufórico. Embora não tenha nada de revolucionário da eleição de um papa. Fiquei boquiaberta quando ele renunciou. Isso sim, era uma atitude revolucionária. Um papa mostrar a face decadente e agonizante da Igreja. Já era hora de admitir, né não?

Mas confesso que fiquei emocionada com a escolha de um papa argentino.Tive formação católica (sin perder la ternura) e uma mãe militante da Teologia da Libertação (jamás). Lembro muito bem de vê-la bater na tecla da desromanização da Igreja e da criação de uma igreja do povo. Uma igreja latino-americana. Realmente, fico feliz por ela ter presenciado esse momento. Não sei se a escolha de Jorge Mario Bergoglio como Papa Francisco I ( Chico I ou Paco I) irá trazer de volta os  ideais de uma igreja moderna com fiéis pensantes como ela almejava na década de 80/90.  Ainda é muito cedo para sabermos se o pequeno passo de Francisco I no Vaticano representará um grande passo para a América Latina.
Pelo menos ele é mais bonitinho que o papa anterior.

terça-feira, 12 de março de 2013

Volta às aulas!


Foto: Acervo Comunicar/PUC-Rio


As aulas começaram hoje!

O curso Tópicos avançados  de teoria e críticas contemporâneas_ Novas subjetividades e outros valores: o reencantamento no pós-moderno me deixou bastante animada e cheia de expectativa. As aulas serão ministradas pela professora Eliana Yunes e Tereza Estarque.
A bibliografia escolhida:

1.A revolução do amor (Luc Ferry)
2. Ensaio sobre a dádiva (Marcel Mauss)
3. Antropologia do dom (Alan Caillé)
4. o caminho da esperança (Stéphane Hessel e Edgar Morin)

sexta-feira, 8 de março de 2013

Hugo Chávez, o americano do Sul (crônica de Raimundo Aragão)

Chávez em comício. Foto: AFP

A opinião da Globo nós já sabemos. Agora vamos ver por outro ângulo. Afinal, somos um país democrático.



Hugo Chavez, o americano do Sul.


Raimundo Nonato Aragão
Cronista


A  morte de Chavez deixa a América do Sul mais pobre de líderes. Ele encarnou  o sentimento nacionalista, bolivariano, latente nos nativos resistentes ao invasor europeu que massacrou e aculturou nosso povo a  partir do seu desembarque neste continente. Era o único chefe de estado da região a se opor de forma clara à política intervencionista praticada pelo bloco Europa/ Estados Unidos. Não rezava de joelhos nas cartilhas do capitalismo e do neoliberalismo. A alinhado com o governo cubano, estrategicamente não ultrapassava os limites que pudessem deixar a Venezuela isolada dos grandes  mercados como ocorreu com Cuba ou na mira dos canhões da OTAN, a exemplo do Afeganistão, Iraque e Síria. 
Irrequieto, exibido,falante, carismático, elegeu-se presidente da Venezuela e foi reeleito com amplo apoio popular em mais três pleitos,  além de ter seu nome referendado em plebiscito realizado em 2004. Sua política voltada para os mais pobres, faixa onde se enquadra a  imensa maioria dos venezuelanos, provocou críticas ferozes dentro e até fora do seu território. Foi insistentemente acusado de truculento, populista e ditador, por  disputar sucessivos mandatos.
 É natural que os líderes políticos tenham adversários, até inimigos mortais, em seus países ou em seus domínios, no caso das grandes potências.   É de se estranhar, porém,  a quantidade de brasileiros  que execravam Hugo Chavez. A Venezuela é uma nação pobre, sem influência política além das  suas fronteiras e uma grande parceira comercial do Brasil, cujo saldo entre exportação e importação nos é inteiramente favorável.
   A rejeição será por influência da revista Veja que moveu campanha sistemática contra Chavez, visando provocar a esquerda brasileira? Ou tem origem antropológica ou racista, uma vez que o falecido presidente tinha  sangue e cor  dos povos primitivos da América, valorizava suas origens e os brasileiros na sua maioria são, ou imaginam ser, étnica e culturalmente herdeiros do colonizador europeu?
O general Augusto Pinochet derrubou em 1973 o governo democrático do Chile em golpe militar no qual morreu o então presidente Salvador Allende. Há registros de que assassinou, prendeu, torturou dezenas de milhares opositores, expulsou milhares estudantes das universidades e desempregou por motivos políticos cerca de  200 mil operários.   Manteve o país sob feroz ditadura até 1990.
O general Alfredo Stroessener tornou-se ditador no Paraguai também através de golpe militar  e se manteve no poder absoluto durante 35 anos. Deu proteção a criminosos nazistas, entre estes, o carrasco Josef  Mengele. Foi um dos pilares da “operação condor” que promoveu seqüestros, assassinatos, torturas em toda a América do Sul. Antes de morrer tranqüilo em Brasília no ano de 2006, respondeu  a inúmeros processos por corrupção.
Chile e Paraguai também são nossos vizinhos e não me recordo de a grande imprensa brasileira ou mesmo o cidadão comum fazerem críticas tão ácidas a seus ditadores sanguinários quanto faziam a Chavez que, por sinal, nunca foi acusado de corrupção ou de torturas, assassinatos e outras atrocidades. Afinal, Pinochet era filho de militar de origem francesa e Stroessener era filho de alemão. Comparado com essas feras o “índio” Hugo Chavez era um anjo bom que retornou ao Paraíso.
Embora não conseguindo implantar a igualdade social por ele pretendida, a história não poderá negar  que Chavez devolveu a seus irmãos que, por sua morte  encharcaram de lágrimas ruas de Caracas, uma dádiva caríssima aos miseráveis, infelizes e desamparados: a esperança. Espero que este sentimento não seja enterrado junto com seus restos mortais.


terça-feira, 5 de março de 2013

Em cima das árvores

Na  Casa José de Alencar, em 2008.

Desde que criei esse blog  me recordo dessa foto.
 Foi tirada por uma amiga, Carmina Dias, em janeiro de 2008, durante o intervalo de uma reunião do Movimento Proparque na Casa José de Alencar.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Cenas dos próximos posts

O livro de memórias da profª Azar Nafisi, O que eu não contei (2009), está fazendo parte da minha leitura diária nessas férias. Ao lado, o livro Orientalismo (2007) de Edward Said. Ambos são a complementação para um futuro e esperado post sobre o trabalho da autora Lendo Lolita em Teerã (2010) que une Literatura e resistência.



Folder do show em comemoração dos 70 anos do músico e poeta tijucano, carioca, brasileiro, universal, Jards Macalé, que tive o privilégio de estar presente com meu n-amor-amigo-ado, Marcos. Houve a participação da Adriana Calcanhotto (com longas madeixas), Thaís Gulin (atual do Chico) e Ava Rocha ( filha de Glauber Rocha). Quem sabe, finalmente, não escrevo sobre música?





Estômago (2007), filme de estreia de Marcos Jorge. Vi na sexta-feira e me de uma mãozinha hoje na hora de preparar o almoço. Claro, é um filme de ácido suspense. Destaque da foto para Fabiula Nascimento e João Miguel.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Um presente de grego no aniversário do Rio




Fim de tarde no Rio. Engarrafamento. Chuva.  Nada de ônibus!



 Hoje, 1º de março de 2013, é aniversário do Rio, 448 anos.

Na TV, comemorações sobre o MAR, o Museu de Arte do Rio que também será uma escola com mesmo fim. O museu é uma parceria da Fundação Roberto Marinho e a prefeitura do Rio. Entende-se tamanha divulgação e o tamanho do empreendimento!

O problema é que hoje, no aniversário da cidade, não fez sol como gostam os cariocas. Está nublado e com aquela chuvinha fininha, chatinha...intermitente.
E a grande surpresa foi a greve dos ônibus. Mais de 1 milhão de pessoas dependem do transporte coletivo aqui.

Da janela, vejo as pessoas caminhando, amontoando-se nas vãs, nos táxis, nos poucos ônibus que circulam.

Mas acho que a inauguração do MAR não vai sofrer com essa greve, afinal, os convidados para essa noite tão ilustre não precisam de transporte coletivo.